FLORIANÓPOLIS: O ano era 2020, e uma pandemia assolou o mundo. Não diferente do que se poderia esperar, uma crise econômica se anunciou (e se cumpriu). Os mercados entraram em pânico e, tudo que ontem valia 100, hoje vale 50. Do dia para a noite, empresas consolidadas na história foram arruinadas, desempregando milhares diretamente e, milhões, indiretamente.
Mas um segmento, aparentemente imune a essa tensão, ao invés de sofrer, foi beneficiado. O isolamento social fez com que quem antes morava em um apartamento pequeno (pois passava a maior parte do dia no escritório e na rua), passasse a olhar com mais atenção para imóveis maiores.
Sem nenhuma surpresa, acompanhamos o mercado imobiliário despontar, elevando seus preços a patamares nunca antes vistos. A queda abrupta na taxa básica de juros também foi colaboradora para que os preços (ainda que no auge) pudessem ser suportados pela capacidade de pagamento dos compradores. Mas o mar de rosas não duraria muito tempo.
Poucos meses após tamanho fervor, o mercado já mostra sinais de esgotamento. A taxa de juros já não é mais de 2% ao ano, mas de 10%. Os imóveis que antes, quando financiados, tinham uma parcela 1x, hoje tem uma parcela 4 ou 5x. O custo de moradia (quanto se gasta mensalmente para morar de aluguel vs. quanto se gasta mensalmente para morar em imóvel próprio, financiado ou quitado) já não faz mais sentido.
Não sou grande fã de comentar casos concretos, mas aconteceu comigo, esse fim de semana (o que me levou a escrever esse texto em pleno domingo). Eu estava almoçando ontem, sábado (05) quando encontrei, despretensiosamente, um colega, João (vou assim chamá-lo) que me contou entusiasmado que havia comprado um apartamento muito próximo de onde almoçávamos. Para nossa surpresa, eu estou negociando um imóvel no mesmo edifício, porém para locação.
Papo vai, papo vem, João me confessou que estava um pouco angustiado com o preço que havia pagado pelo imóvel: R$3.45 milhões. Ele não deveria ter feito a pergunta que me fez, logo na sequência, pois, como já estava desgostoso do negócio, ficou ainda mais quando soube por quanto estou fechando a locação: R$8 mil. Veja, R$3,45 milhões para compra contra R$8 mil de aluguel, para o mesmo imóvel, mesma área, tudo igual, com exceção de serem duas unidades distintas, uma no 7º e outra no 8º andar.
Saí do almoço me perguntando: estaria João ingenuamente otimista ou intencionalmente cego quando fechou negócio? João não é uma pessoa qualquer. Pessoas comuns não têm R$3.45mi para comprar um imóvel. Aliás, a média de preços dos imóveis vendidos em São Paulo (maior mercado imobiliário do Brasil) nos últimos anos foi de R$500 mil.
João agora vai precisar digerir esse abacaxi. Seja amargando um prejuízo, caso precise vender o imóvel dentro de alguns anos, seja tendo que aguardar muito tempo, até que o imóvel passe a valer tanto quanto ele investiu, mais os rendimentos do que ele poderia ter ganhado caso tivesse feito uma aplicação financeira com o valor que usou para adquirir o bem.
"No Paraíso, todos dizem a verdade. É isso que o torna o Paraíso." Não espero que me digam a verdade, só espero que não mintam. O mercado não aceita mentiras. Pelo menos, não por muito tempo.
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